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No contexto desse versículo, Abrão está em ditosa idade, 99 anos. Aos 75 anos ele deixou Harã (Gn 12.4), portanto, 24 anos se passaram, era a escola divina na vida do patriarca e peregrino. No mesmo capítulo, Deus muda o nome de Abrão para Abraão, bem como o nome de Sarai para Sarah. Para que a promessa se cumprisse eles precisavam de força, da mão do Todo-Poderoso. E é assim que Deus se revela. Vamos analisar a situação.
A primeira vez que essa expressão aparece é em Gn 17.2. O Eterno Deus se revela a Abrão de forma especial e decisiva. A análise tradicional do nome é: “Deus (el) que (sha) é suficiente (day)”. Mas recentemente se identificou Shaddai com “montanha”, uma referência a Deus como rocha, concepção dada por W.F. Albright. Porém, Speiser mostrou as fraquezas e os problemas nessa identificação.[1]
Uma coisa é certa: o termo está dentro do conceito de poder diante das fragilidades humanas, percebe-se que é o título favorito no Livro de Jó.
Rashi afirma que El Shadai significa “Eu Sou Aquele que tem poder suficiente em Minha Divindade para dar a toda criatura”. [she / que e dái / suficiente]. Portanto, anda diante de mim e Eu serei para você Deus e Protetor. Onde quer que apareça na Bíblia, significa “A suficiência dEle”, porém Rashi lembra que em cada local deve ser interpretado de acordo com o contexto.[2]
Wiersbe dialoga que o termo shaddai é traduzido por Todo-Poderoso 48 vezes no Antigo Testamento. El é o no de Deus e refere-se a poder.
Wiersbe continua dizendo que não há unanimidade quanto ao significado do nome. Alguns entendem que vem de uma palavra hebraica que significa “ser forte”; outros preferem uma palavra que quer dizer “montanha” ou “seio”. Em termos metafóricos, uma montanha é um seio que se eleva da planície e constitui um símbolo de força.[3]
Rifka traduz “Shad” como seio, mama.[4]
Champlin afirma que Todo-Poderoso, no hebraico, El Shaddai têm significado incerto da combinação (com El, “força” “poder”), e vai pontuar algumas sugestões e interpretações, a saber:
- Alguns pensam que shaddai é um termo cognato do acádico para “seios”. Isso significaria, metaforicamente, que Deus é que nos supre as nossas necessidades, visto que com os seios a mulher alimenta seu infante. Nesse caso, o Poder (El) agora viera para suprir todas as necessidades de Abraão. Os críticos fazem-nos lembrar das deusas de muitos seios das culturas pagãs, supondo que tenhamos aqui um reflexo de alguma deusa cananeia cujo nome foi aqui tomado por empréstimo, para tornar-se um dos nomes de Deus. O termo hebraico shad, “seio”, pode ser cognato do acádico. Essa palavra é usada, com freqüência, para indicar esse órgão feminino (Gên. 49.25; Jó 3.12; Sal. 22.9; Can. 1.13; Eze. 16.7). Deus, pois, seria encarado como Ser poderoso, aquele que satisfaz aos “infantes espirituais”. Ou Ele ter-se-ia aqui mostrado todo-suficiente para todas as nossas necessidades. Ele tanto enriqueceria quanto tornaria frutífero o crente, e essa teria sido a própria intenção do Pacto Abraâmico.
- Alguns estudiosos sugerem que a palavra significa “ser poderoso a ponto de avassalar”. Então estaria em pauta a ideia de Deus poder ultrapassar qualquer obstáculo, mediante Seu poder inerente.
- Essa palavra derivar-se-ia do hebraico shadah, “derramar”, indicando a ideia de abundância de suprimento e de forças que Deus proporciona. Ele daria aos crentes de maneira rica e abundante.[5]
O que podemos concluir?
A questão sobre a origem dessa palavra é obscura. Mas podemos buscar alguma luz, vejamos:
Sabe que as línguas semíticas formam, pelo menos, três grupos:[6] nordeste (acádico, assírio e babilônico), noroeste (hebraico, hebraico samaritano, aramaico, siríaco, canaanita, moabita, edomita, por exemplo) e meridional: árabe, etíope, por exemplo. Ou seja, o tronco é o mesmo, são todas línguas semíticas, com forte influência umas nas outras, tanto alfabética quanto nos significados.
Diante disso, é fato que o nome se associa a poder, a força de Deus. E que, quando Deus se revelou com a expressão El Shaday, Abrão já havia saído das regiões do Sul da Mesopotâmia, bem como de Harã, na antiga Assíria. Abrão estava nas regiões de Canaã e sofrendo influência das línguas daquela localidade, que era a região noroeste com os “dialetos” hebraico, aramaico, siríaco e canaanita.
As duas vezes que a Torá faz menção direta de Deus falando com Abrão nas regiões da Mesopotâmia, Deus se revela com seu Nome pessoal (Gn 12.1 e Gn 15.7 – YHWH). Percebe-se que, mesmo Deus usando seu Nome pessoal, toda essência do significado do Seu Nome só viria mais tarde com Moisés no episódio da sarça.
Ao que parece, o nome El Shaday ainda não havia sido revelado, senão apenas no Capítulo 17. Em Gn 15.8, Abrão chama Deus de “ADONAY YHWH”. Sabe-se que a essência, como falado, do nome pessoal de Deus só foi revelada depois a Moisés (Êx 3.13-14; 6.3). Em Êx 6.3, o próprio Deus diz: Apareci a Abraão, a Isaque e a Jacó como DEUS TODO-PODERODO (El Shaday), mas pelo meu Nome YHWH, não lhes fui conhecido.
A revelação é progressiva, o verdadeiro significado do Nome, o conhecimento mais profundo do Nome foi revelado a Moisés. A questão não está fechada. Precisamos de bom senso pra não afirmar aquilo que não está ao nosso alcance.
No demais, espero que goste e indique essa leitura para todos os que amam estudar as Sagradas Escrituras.
Abraços e até mais!
REFERÊNCIAS
[1] Kidner, Derek. Gênesis – Introdução e Comentário, p.120
[2] Rashi, Torá Rashi, p. 135
[3] Wiersbe, Warren. Pentateuco, p.112.
[4] Berezin, Rifka. Dicionário Hebraico-Português, p.620.
[5] Champlin, Russel. AT vol 1, p. 126.
[6] Para maiores esclarecimentos consultar: Alves, Roberto: gramática de hebraico clássico e moderno; Ross, Allen: Gramática de Hebraico Bíblico.
Muito bom professor.
Amém!
Obrigado meu amigo!!!
Muito boa explanação professor. Vejo que poderá estendê-la por mais folhas, pois ainda há muito a ser dito sobre o assunto. Fico no aguardo de mais conhecimento. Obrigado meu Mestre.